Índia da Lagoa da Vala

Nasceu morena, com grande cabelo, tal como índia mesmo. Todos diziam que a menina era muito, muito linda e assim cresceu. Uma pessoa comum, com muita beleza, bem criada, bem nascida como diziam os antigos.

Quando moça, enamorou-se por um rapaz de boa família também, trabalhador, de Lagoa da Prata. Casando-se os dois, estabeleceram morada nas proximidades da “Lagoa da Vala”, perto da família do moço, comunidade formada por pessoas que trabalhavam na Usina Luciânia.

As casas eram “geminadas”, sendo que uma pequena escada dava na porta da sala. Os vizinhos eram todos amigos e conhecidos. O rapaz trabalhava de forma a cuidar da então formada família. Logo uma criança veio a abrilhantar ainda mais a história dos dois, história até então de muito amor.

Contudo, esta história não teve um final feliz. É que o rapaz chegando em casa, deparou com ‘rastros’ de botina que davam para a porta da sala, desde o portão. O homem ficou desconfiado e sentiu muito dissabor. Aguardou com as mãos trêmulas e o peito apertado a chegada da esposa, sobre a qual depositava muito amor e fidelidade.

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A moça adentrou a porta da cozinha e ele de forma muito áspera, segurou-a pelos braços, quase deixando a pequena criança cair no chão encerado da cozinha. A mulher, estranhando a atitude grosseira do marido, perguntou-o, assustada, o que havia acontecido com ele. Notou certo ar de bebida em sua boca e ficou ainda mais atemorizada, ante o fato de que até então, nunca tinha sentido cheiro de bebida nele, tampouco em suas roupas. Até aquela data ele nunca tinha bebido.

Explicou a ele que um vendedor, enviado por sua cunhada, irmã dele, havia batido palmas em seu portão. Em virtude da chuva fraca, convidou-o a adentrar em casa, instalando as colchas, cobertores, roupas de cama, redes e outros utensílios de cozinha, na sala, sofá e no pequeno corredor da casa. A própria cunhada esteve em sua casa a fim de apanhar o troco com o vendedor.

Disse mais: que a casa permaneceu aberta e o vendedor ficou ali pouco prazo, pouco mais de meia hora e que a vizinha ao lado, também ali esteve por poucos minutos, inclusive auxiliando o vendedor a guardar os pertences no carrinho. O homem ficou observando a fala da esposa mas não se acalmou. Bateu a porta da sala e saiu…

Retornou por volta das 10 horas da manhã do outro dia, pegando-a pelos braços, tomando a criança e empurrando-a, dizendo que a levaria para a casa dos pais dela, que estava tudo acabado. E assim fez. Levou a mulher até a casa dos pais dela.

O Pai, assentado na mesa da cozinha estava, assim permaneceu. Disse apenas que a filha esteve com ele todo o tempo e que era muito bem vinda com a neta. Que pensasse bem, vez que não mais permitiria que ela saísse de casa para reatarem. O rapaz deu de ombros, respondendo-o de forma acabrunhada, saindo pelo portão.

A mulher explicou ao pai o acontecido e este sorriu, dizendo apenas que ela não ficasse nervosa, que ali continuava sendo a sua casa, e seria a casa dela para sempre, se ela assim quisesse permanecer. A mãe ficou calada. Seu instinto lhe dizia que algo muito ruim estava para acontecer. E o sinistro se deu na tarde de domingo, logo depois do almoço. A mulher estava assentada nos fundos da casa da vizinha. Sempre foram muito amigas. Contavam causos. Ouviu ela o trançar do portão de lata, o qual fazia muito barulho quando abria ou fechava, denunciando um visitante.

Escutou vozes na sala e observou que era o seu marido até então. Ela saiu apressada, amamentando a criança que estava “agarrada” em um dos seus seios, cheios de leite. Adentrou a porta da sala perguntou ao marido se ele estava ali para busca-la, visto que estava com muita saudade dele e de sua casa.

Qual não foi a surpresa de todos ao ver o homem sacando um revólver pequeno das costas, da cintura, apontando para ela e dizendo que realmente tinha vindo busca-la, disparando contra ela, acertando-a no abdômen.

Quando esta se virou para tentar correr, o homem disparou novamente, acertando-a nas costas. A mulher caiu… O homem passou por ela, descendo as escadas calmamente, como se nada tivesse acontecido, saindo pelo portão, ganhando a rua, indo em direção a uma beca de cana nas proximidades.

E a cena mais deprimente, mais triste, revoltante ao extremo, que chocou toda a comunidade, que trouxe repúdio, que trouxe indignação à todos que ali residiam, que fixou a história na cabeça de todos, revoltante, foi ver a criança ainda mamando no seio da mãe morta…

Histórias que o povo conta…

/IJR

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